Relato de parto: o nascimento do meu primeiro filho

Relato de parto: o nascimento do meu primeiro filho

Felipe Ramos, do blog Papo de Homem, conta como é ser pai de primeira viagem.   

Confesso que foi difícil começar a escrever este artigo. O nascimento do Noah foi a experiência mais emocionante da minha vida e mergulhar naquelas lembranças me trazia uma carga emocional muito forte. O desafio era resgatar a memória afetiva e reconstruir o acontecimento, mergulhando em um mundo de sons, odores, luzes e vida.

Há uns 6 meses relatei como estava me preparando para ser pai e como se deu o processo de descobrir que minha esposa estava grávida. Já neste artigo vou compartilhar exclusivamente questões relacionadas ao parto: como se deu a busca por um parto natural, sobre meu papel como pai e parceiro, a relação com a doula, e vou tentar ser preciso para relatar a experiência em detalhes.

Espero que seja benéfico para futuros papais e mamães na busca por melhores condições de parirem seus filhos.

Desde o momento em que soubemos que seríamos pais, a Larissa e eu mergulhamos em um mundo novo. Sabíamos ter quase nenhum conhecimento sobre trazer uma criança ao mundo. O que tínhamos certeza era que, em pleno 2017, havia muita informação para ser acessada de forma livre e gratuita, e que dependeria somente de nós, como pais, mergulhar nesse vasto mundo sobre o nascimento da vida humana e fazer do nascimento do Noah, a experiência mais bela possível.

O tipo de parto

A busca por conhecimento sobre o parto é uma coisa maluca. Quanto mais tempo e empenho você dedicar, maiores são as chances de que o parto aconteça alinhado com suas crenças e valores. Crenças essas que são adquiridas ao longo do processo de estudo, de entendimento sobre o parto. Para se ter uma ideia da quantidade de informação disponível, em 0,35 segundos, o Google encontrou nada mais nada menos do que 24 milhões e 500 mil páginas sobre gravidez.

Pais que não buscam conhecimento acerca do parto podem ser indiferentes a muitas questões importantes para o nascimento simplesmente por não conhecerem as consequências de certos procedimentos e o impacto que isso pode ter no nascimento de seus filhos.

A nossa busca por informação se deu muito pela sede de aprender da Larissa, minha esposa. Desde 20 de janeiro (dia que a cegonha nos contou da novidade) até o dia do nascimento, ela dedicou centenas de horas para estudar diferentes aspectos da gravidez, do parto e da criação do nosso filho. A minha busca foi um pouco diferente, com um misto de medo e insegurança. Eu ia atrás de artigos sobre papais de primeira viagem, sobre apoio emocional para a mamãe e como se preparar para ser pai.

O epicentro de toda a busca se deu na encruzilhada do tipo de parto que teríamos. Lemos que a cesariana aumenta em 120 vezes a probabilidade de problemas respiratórios com o bebê e em 3 vezes o risco de morte da mãe. Em contrapartida, o parto normal concede à mamãe e ao bebê uma série de benefícios, seguindo o processo natural da vida.

Decidimos entrar mais a fundo nesse ponto e encontramos um documentário, O renascimento do parto, que joga luz na realidade obstétrica brasileira. Este filme, além de emocionante, nos abriu os olhos para uma série de fatores fundamentais que precisaríamos lidar e decisões que deveríamos tomar.

A primeira foi que não queríamos perder o controle do nascimento do nosso filho e não queríamos entregar essa experiência para a tecnologia. Queríamos ser donos daquele momento mágico que iria acontecer em alguns meses.

A decisão por não fazer cesariana e encarar um parto normal partiu da Lari. Eu falei que iria apoiá-la em qualquer dos caminhos que ela escolhesse. Que o corpo era dela e ela precisava estar 100% segura com o caminho que fosse seguir.

Sabendo que a cesariana só seria uma opção em necessidade médica, fomos entender melhor os caminhos disponíveis e mergulhamos no universo do parto natural. Queríamos que houvesse a menor quantidade possível de intervenções médicas e deixar a natureza fazer o seu trabalho.

A escolha da médica e plano de saúde

Em meados de 2016, quando decidimos que teríamos um filho, fomos atrás de um plano de saúde que fosse um aliado ao longo da gravidez. A opção pelo Bradesco Top se deu por ter uma relação de excelente custo-benefício e uma ótima rede de hospitais em São Paulo. O custo de 350 reais mensais pagos pela Lari se mostrou um ótimo investimento, pois cobriu absolutamente todos os procedimentos, exames, consultas realizadas ao longo da gravidez e 100% do parto com internação em ótimo hospital.

Nossa intenção era de ficar sob os custos do plano de saúde durante toda a gravidez e, dessa forma, buscamos uma médica obstetra que trabalhasse com o nosso plano. A busca pelo médico nessa ocasião se dá quase que exclusivamente por meio de indicação em virtude de toda a seriedade da situação. Não é uma opção você abrir o site do plano de saúde, listar todos os médicos obstetras autorizados e escolher um de forma aleatória ou por simpatizar com o seu nome. A indicação de amigos para nós foi muito importante para nos ajudar nessa escolha.

A escolha da Dra. G. (não vou citar seu nome e sobrenome, vocês entenderão mais para frente) nos pareceu muito satisfatória, pois ela tinha muitas referências boas na Internet, muitos comentários de pacientes que a adoravam, ela atendia no São Luiz, tinha seu consultório nas proximidades do hospital e sempre foi muito querida conosco. O fato de ela ter um histórico com partos normais nos ajudou a ter certeza de que ela era a nossa melhor escolha.

Uma doula na nossa vida

No dia três de maio (na metade da gravidez), recebi um e-mail de uma assessoria de imprensa me convidando para um "encontro inédito para auxiliar casais que desejam ter filhos do ponto de vista emocional, físico e financeiro" intitulado Curso de Preparação Parental. O curso foi criado pela doula e psicóloga Raquel Jandozza e teria 8 horas de duração em um único dia.

Mal sabia eu da importância que a decisão de fazer esse curso teria na minha vida e consequentemente na da Lari e do pequeno Noah.

O curso aconteceu em um Sábado de sol e passou num piscar de olhos. A Lari, já com uma barriga volumosa e eu, fomos levados à discussão da maternidade de uma forma menos romântica e mais realista. Como poderíamos nos fortalecer para essa grande aventura que estávamos prestes a embarcar? Lembro nitidamente de, ao final do dia, perguntar à Lari: "Não vejo razão para não termos uma doula ao nosso lado no processo do parto. Tu vês?".

E foi assim que decidimos que teríamos a presença de uma doula para nos ajudar a passar com as melhores condições emocionais e físicas por um parto natural.

A decisão não poderia ser outra a optar por Raquel. Com toda a leveza e gentileza no olhar, ela nos cativou desde o início daquele Sábado ensolarado.

O plano de parto

O trabalho de doulagem é algo simplesmente lindo. O termo "Doula" vem do grego "mulher que serve", e é justamente esse o seu papel. Estar ali, com os pais durante todo o procedimento do parto, dando apoio emocional e físico e suporte para que a natureza faça o seu trabalho.

Já na primeira sessão pré-parto, a Raquel nos orientou sobre todo o processo e evolução do parto, decisões que precisaríamos tomar e clarificar sobre o seu papel como doula.

Um dos pontos mais importantes foi definirmos o plano de parto, com as principais decisões do processo como um todo, para evitar imprevistos, nos levar a conhecer e pensar sobre cada etapa e de deixar às claras nossas preferências para toda a equipe que fosse participar do parto.

No plano, decidimos pontos importantes que deveriam ser seguidos por todos envolvidos:

Questões relacionadas ao trabalho de parto:

  • Decisão por parto normal, sem indução;

  • Preferência por aguardar a evolução do trabalho de parto em casa;

  • Presença do marido e da doula durante todo o trabalho de parto;

  • Liberdade por usar a banheira do quarto sempre que sentir vontade.

Sobre o parto:

  • Preferência por um ambiente calmo;

  • Liberdade total para realizar as posições que mais forem confortáveis;

  • Preferência por não haver episiotomia;

  • Que o bebê fosse diretamente para o colo da mãe ao nascer.

Após o parto:

  • Aguardar expulsão espontânea da placenta com auxílio da amamentação;

  • O bebê deve ficar com a mãe o tempo todo, mesmo para avaliação e exames;

  • A mãe quer ser informada e consultada para que os procedimentos sejam realizados em seu bebê, sendo avaliadas inclusive a necessidade dos mesmos e liberação para o apartamento o quanto antes;

Cuidados com o bebê:

  • Amamentação sob livre demanda, não oferecer água glicosada, fórmulas ou bicos;

  • Alojamento conjunto o tempo todo;

  • Pediatra faz avaliação no nosso quarto.

Em caso de cesárea:

  • Caso a cesárea seja necessária, gostaríamos da presença do marido e ou da doula;

  • Anestesia: sem sedação;

  • Não gostaria de ver a hora do nascimento, portanto manter o protetor;

  • Após o nascimento, gostaríamos que colocassem o bebê sobre o peito da mãe e que suas mãos estejam livres para segurá-lo;

  • Amamentação o quanto antes.

Ao final, a Larissa, a doula e eu assinamos o documento que foi levado impresso para a médica também assinar e o entregaríamos na entrada do hospital para que todos os envolvimentos no parto ficassem cientes das nossas decisões sobre todos os aspectos referentes à vinda do Noah.

Outra recomendação importante da Raquel foi com relação a fazermos contínuas e longas caminhadas pelo bairro. Caminhar durante a gravidez ajuda o controle de peso, a manutenção do condicionamento físico da mãe e sua melhoria das condições circulatórias e hormonais e foi um momento importante ao longo de vários meses.

Relato de parto

A DPP (data prevista para o parto) era dia 23 de Setembro. Em condições de cesariana, iríamos estimar essa ou outra data próxima para que o Noah viesse ao mundo. Como em um parto natural não se define quando o bebê nascerá, o dia do nascimento é, basicamente, quando acontece (salvo em condições de risco e/ou complicações).

Sendo assim, qualquer hora é hora e precisamos estar prontos.

No dia 9 de Setembro, a Lari estava de 37 semanas, era um sábado e passamos boa parte da tarde assistindo a série Big Little Lies. Ao longo da tarde, com muito desconforto, ela decidiu fazer exercícios com bola de pilates (indicação da doula para melhorar desconfortos gerados pela gravidez) e, em seguida, optamos por uma caminhada longa pelo bairro. Não passava pela nossa cabeça que esse seria o dia que as nossas vidas mudariam para sempre.

Voltamos para casa por volta das 18h30 e a Lari foi para o banho. Aí apareceu a primeira cólica.

Ao longo da meia hora seguinte, duas novas cólicas e entendemos que isso poderia ser um sintoma do início do trabalho de parto, conhecido como fase latente. Por volta das 20h, e com as cólicas aparecendo a cada 15 minutos, decidimos contatar Raquel para saber o que fazer. Embora as cólicas fossem fracas e indolores, entendemos que eram sinais de que algo estava por vir.

A orientação de Raquel foi para andarmos por 1 hora na rua e, na volta, a Lari tomar um longo banho quente para ver se o quadro iria evoluir ou se era um alarme falso.

Após o banho demorado, o relógio marcava 22h30 e estávamos apreensivos e felizes. O espaço de tempo entre uma cólica e outra tinha caído para 10 minutos, porém não tínhamos ainda certeza se a Lari estava de fato em trabalho de parto.

Com esse novo quadro, a orientação da doula foi para que a Lari se alimentasse e tentasse dormir um pouco, pois se o quadro evoluísse, ela iria precisar de todas as forças possíveis. Durante o jantar, as contrações vieram e ritmaram de 6 em 6 minutos. Isso foi um sinal claro de que o trabalho de parto estava começando.

Como as contrações aceleraram rapidamente, decidimos em conjunto com a Raquel que iríamos para o hospital São Luiz para uma análise clínica da evolução do parto. A entrada no hospital aconteceu às 2h38. Eu estava nervoso como poucas vezes na vida. Estava prestes a participar de um momento única e que iria fugir muito do meu controle. Meu papel era de dar assistência e suporte, mas sabia que a Lari seria a grande responsável por colocar o Noah nesse mundo.

Depois do primeiro passo dar entrada com os procedimentos burocráticos no hospital, fomos encaminhados para fazer a avaliação médica e entender o estágio do parto. Colocaram o cardiotoco para avaliar a frequência cardíaca do Noah e das contrações uterinas e fizeram exame de toque.

A Lari estava com 3cm de dilatação e, por indicação do corpo médico, deveria andar pelo hospital para tentar aumentar a dilatação e recebermos autorização para entrar diretamente no quarto chamado de delivery, especial para partos naturais e humanizados. Só liberam mães para esses quartos com 6cm de dilatação e o hospital conta com somente tries deliveries disponíveis.

Ou seja, estávamos ansiosos para conseguir uma vaga.

No período em que passamos entre os corredores do hospital e a enfermaria, a dor já estava presente e se intensificado bastante. O papel da doula de aliviar a dor com o uso de massagens teve o seu início.

O time médico estava tentando contatar a Dra. G. e estávamos contando que tudo iria dar certo, ela iria chegar e não haveriam imprevistos.

Com cerca de duas horas de caminhadas e exercícios para aumentar a dilatação, a Lari precisava de um quarto, um chuveiro e já não conseguia mais ficar de pé sozinha no momento que a contração chegava. Por isso, voltamos para fazer o exame de toque para dar entrada no quarto e descobrimos que ela estava com 6cm pra 7cm de dilatação.

Com isso, recebemos duas notícias.

A boa era a autorização para entrar no quarto delivery. Tínhamos enfim, conseguido a tão almejada vaga. Já a notícia ruim veio como uma bomba. A Dra G. estava em um aniversário de família e tinha dormido em uma cidade do interior e não iria poder fazer o nosso parto.

Nesse instante, tentei absorver tudo o que isso significava. Que tínhamos empenhado meses de preparação com ela, nos certificando que ela era a médica ideal, quem estávamos depositando uma confiança talvez nunca depositada em alguém nas nossas vidas. Ela simplesmente sabendo que estávamos no mês da chegada do Noah e que o parto seria natural, decidiu passar a noite fora de São Paulo. Nesse momento, procurei relaxar e tranquilizar a Lari, diminuindo a importância da médica para que a Lari, em meio a tanta dor, não surtasse.

O papel da doula ficou ainda mais claro. Com todo o carinho e atenção, ela disse para a Lari:

O parto é você quem faz. Eu estou aqui para te ajudar física e emocionalmente. Vai dar certo. Estamos juntas!

Às 5h33 entramos no quarto, praticamente três horas depois de chegarmos ao hospital. Ele era muito melhor do que eu imaginava! Contava com uma banheira redonda, iluminação vermelha e indireta e música ambiente.

Eu estava vestido com roupa de acompanhante, protetor nos calçados e uma touca esterilizada. Uma das minhas funções era a de transmitir para as nossas famílias as atualizações do cenário, enviar fotos e vídeos. Até uma chamada de vídeo eu fiz para a mãe da Lari enquanto ela fazia exercícios de relaxamento na banheira.

As horas pareciam passar mais demoradamente.

A cada minuto, a dor aumentava e a expectativa também. Lari, Raquel e eu formávamos um trio imbatível.

Como a vida nos prega peças e dá muitas voltas, fomos atendidos por uma médica plantonista jovem e com muita experiência em partos naturais. Ela fazia sempre plantões no SUS, mas era a sua primeira noite no São Luiz. A Dra. Ana Cláudia nos deixou muito tranquilos e confiantes. Eu tinha certeza de que tudo ia dar certo e estava seguro.

Relendo as mensagens do grupo de Whatsapp para relembrar com precisão os acontecimentos da noite, leio que às 8h48 da manhã eu comuniquei à todos que a dilatação estava de 9cm para 10cm e que a médica de plantão estimou em 30 minutos para nascer. A dor já estava insuportável e a Lari comenta que só não pediu analgesia porque o Noah estava prestes a chegar e se recebesse o analgésico, o nascimento iria retardar.

Esses 30 minutos se prolongaram e a Dra. Ana Cláudia nos sugeriu que rompêssemos a bolsa, até então intacta. Isso ajudou na aceleração do parto, porém aumentou consideravelmente a dor, uma vez que não havia mais a bolsa para proteger a descida do filho.

O período expulsivo durou exatamente 1 hora e 8 minutos e foi muito dolorido e emocionante. Fico com lágrimas no olhos de lembrar e, para escrever estas palavras, revivo esse momento com uma alegria que transborda.

Noah veio ao mundo com 3 quilos e 50 centímetros, com muita saúde, em perfeitas condições e com olhos brilhantes. Segundos depois, já estava nos braços da Lari.

Todos em prantos. Choro abundante e permitido. Nada mais era importante. Somente estar ali, com ele e com ela. Me senti o homem mais feliz do mundo. Mais do que jamais me sentira nos 35 anos de vida.

A rádio neste exato momento estava tocando "Thinking Out Loud", do cantor Ed Sheeran e o quarto pareceu o lugar mais perfeito do mundo.

Como parte do plano de parto, cortei o cordão umbilical, dei o primeiro banho e me senti vivo. Em momentos como esse nos damos conta de como a vida é uma benção.

Bem vindo, Noah.

 

Felipe Ramos é casado com a Larissa e papai do Noah. 

A Infanti apoia essa história, publicada originalmente no Papo de Homem.

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